POR QUE AS ÁREAS VERDES SÃO TÃO IMPORTANTES PARA UMA CIDADE?

Isabelle Meunier*


O capitulo do Artigo 225 da Constituição Federal inicia-se com uma declaração fundamental: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Essa frase define de forma sintética o caráter coletivo dos bens e serviços ambientais e coloca-os como um direito das pessoas, a ser defendido pelo poder público e pela coletividade.Nos socioecossistemas urbanos, onde as condições naturais se encontram quase completamente alteradas e, na maioria das vezes, degradadas, as áreas verdes de diversas categorias representam um recurso precioso para a melhoria da qualidade ambiental. Áreas verdes não significam simplesmente espaços não construídos. Esses são denominados os espaços livres, e não necessariamente verdes. Áreas verdes também não são apenas áreas de solo não impermeabilizado. São sim espaços urbanos não construídos e devidamente protegidos, onde domina o elemento vegetal, notadamente as árvores, de forma a fornecer benefícios ambientais, sócio-culturais e até econômicos a uma cidade. Áreas verdes urbanas melhoram as condições microclimáticas, reduzindo os extremos de temperatura, e protegem o solo da impermeabilização, facilitando a infiltração das águas de chuva. Áreas arborizadas controlam a poluição atmosférica, tanto pela retenção de partículas sólidas quanto pela absorção de poluentes gasosos, com o gás carbônico. Não só a saúde física dos freqüentadores das áreas verdes pode ser melhorada com a prática de atividades físicas ao ar livre, como a saúde mental recebe benefícios já comprovados por pesquisas científicas. Estudos na França já identificaram a redução no tempo de internamento hospitalar em unidades de saúde com amplas áreas verdes e pesquisas nos EUA comprovaram a redução da violência doméstica graças ao "fortalecimento dos laços comunitários" proporcionados pelas áreas livres arborizadas em conjuntos habitacionais populares.Com uma boa diversidade de plantas que, por sua vez, se encarregam de atrair, proteger e alimentar diferentes animais, as áreas verdes urbanos são espaços privilegiados para a educação ambiental. Mesmo reduzidas e geralmente isoladas, guardam uma riqueza considerável de espécies e processos ecológicos, em plena aridez das grandes cidades.E não só isso: a cidadania ganha com a formação de pessoas que valorizam, respeitam e cuidam dos bens comuns, ao mesmo tempo em que usufruem os seus benefícios. A freqüência responsável às áreas verdes urbanas como praças, parques, refúgios e jardins, é uma oportunidade para o exercício de convivência solidária entre pessoas e natureza, para o estreitamento dos vínculos familiares e estabelecimento de novas relações de amizades. A simples contemplação nas áreas verdes possibilita uma experiência estética única, permitindo que se vivencie a harmonia dos elementos naturais, muitas vezes mais bela do que os artificialismos do ambiente construído. E ainda servem como experiência de vida para uma sociedade consumista que pode se surpreender ao gozar de saúde e bem-estar, generosamente ofertados pela natureza. A quantidade e o estado de conservação das áreas verdes de uma cidade poderiam muito bem integrar algum índice de desenvolvimento humano e social. A falta delas demonstra o descaso do poder público para com a saúde física e mental dos cidadãos, a falta de visão do futuro, a estreiteza do planejamento. 

Vista panorâmica de Goiânia (GO)
(foto: ucg.br)
O abandono das áreas verdes, transformando-as em locais de deposição de lixo e concentração de violência, também denota a fraqueza das instituições e a falta de educação, o despreparo e até o desamparo de uma sociedade. Nossas áreas verdes (ou a falta delas) refletem nossas qualidades e mazelas. Por isso a evidente necessidade e oportunidade de se estabelecer um Parque em Boa Viagem ainda gera alguma polêmica, apesar de encontrar amplo respaldo entre a população. A população sabe ser necessário contar com uma área verde para humanizar o convívio e melhorar as condições ambientais do bairro e ensaia uma mobilização. Por outro lado, alguns argumentos contrários parecem se delinear, sem dúvida inspirados pelo alto valor do metro quadrado na área, refletindo nossa dificuldade em priorizar o coletivo em detrimento do privado. A questão é, no fundo, moral: Criar e implementar efetivamente uma nova área verde, nessa cidade onde elas são tão raras quanto necessárias, é se comprometer com interesse coletivo, dessas e de futuras gerações, que têm direito a uma cidade habitável. Desconsiderar esse direito, privilegiando o interesses de alguns, é ética e ambientalmente reprovável, pois ignora a importância desses locais como bem de uso comum do povo, necessários à manutenção da qualidade de vida.Recife precisa dessa e de mais áreas verdes. Tanto quanto precisa de mais segurança, mais escolas, mais empregos e mais habitação. Todos esses são elementos para uma melhor qualidade de vida urbana e defender o meio ambiente como um direito comum não deve ser apenas uma iniciativa de militantes, mas uma obrigação do governo e da sociedade.

* Professora do Curso de Engenharia Florestal da UFRPE

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