RIO — Desde que a epidemia de zika foi declarada emergência
de saúde pública no Brasil, em novembro de 2015, a comunidade científica
internacional vem unindo esforços para desenvolver uma vacina eficaz
contra o vírus. Hoje, existem 39 projetos em andamento, segundo a
Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre as iniciativas mais avançadas,
cinco estão na chamada fase 1, a dos testes em humanos. Se os
resultados forem positivos nessa etapa, a imunização passará por mais
duas amplas rodadas de testes, com número maior de participantes, até
atingir a possibilidade de ser liberada para a população.
No Brasil, a grande aposta do Ministério da Saúde é uma
vacina desenvolvida pelo Instituto Evandro Chagas, do Pará, em parceria
com a Universidade Medical Branch do Texas, nos Estados Unidos. A
previsão é de que os testes da vacina brasileira em humanos comecem
ainda este semestre. O processo que começa com a criação e termina com a
disponibilização de uma vacina dura, em média, dez anos; mas é provável
que a da zika leve menos, já que vários países estão numa corrida por
ela. Hoje já existem vacinas contra dengue e febre amarela. Estudos
sobre a imunização contra a chicungunha, outra doença transmitida pelo
Aedes, estão menos adiantados.
DOENÇA TEM APENAS UM TIPO DE VÍRUS
Um
dos pontos que tornam essa tarefa menos complexa é que existe somente
um tipo de vírus da zika, ao contrário de outras doenças transmitidas
pelo Aedes aegypti, como a dengue, que tem quatro cepas.
— Tenho praticamente certeza de que desenvolveremos uma
vacina mais rapidamente. Devemos avançar, nos próximos anos, para a
obtenção de uma imunização ou até de mais de uma — afirma Wilson Savino,
diretor do Instituto Oswaldo Cruz e membro do Gabinete de Enfrentamento
à Emergência em Saúde Pública da Fiocruz.
Uma vez consolidada pelo Instituto Evandro Chagas, essa
vacina terá tanto seus estudos clínicos quanto sua fabricação realizados
pela Fiocruz. O projeto pretende criar uma vacina com o vírus atenuado,
o mesmo princípio da imunização contra a febre amarela, que tem
eficácia de mais de 95%.
Segundo Savino, uma das dificuldades para alcançar uma
vacina segura e eficaz é que ainda não se conhece com exatidão a
resposta do corpo humano ao vírus da zika. Não se sabe, por exemplo, se
os indivíduos ficam imunes a uma segunda infecção e se a resposta
imunológica à dengue pode influenciar a da zika, ou vice-versa.
Outro ponto fundamental é que, enquanto grande parte das
outras vacinas é contraindicada para grávidas, a da zika precisa ser
especialmente aplicada nesse grupo, para evitar o risco de a infecção
afetar o desenvolvimento cerebral do feto.
O primeiro projeto de vacina da zika a ter liberação para
iniciar testes em humanos, em julho do ano passado, foi o elaborado pela
farmacêutica americana Inovio em parceria com a empresa sul-coreana
GeneOne Life Sciences. Consiste em usar um fragmento do DNA do vírus,
criado em laboratório, para estimular uma resposta imunológica. Esse
método é considerado o futuro da vacinação mundial. Segundo as empresas
parceiras, a previsão é de que a fase 1 seja concluída no fim deste ano
ou no início de 2018.
Outro projeto promissor é o desenvolvido pela Sanofi Pasteur
— responsável pela primeira vacina contra a dengue — em conjunto com
centros de pesquisa da Universidade de Harvard, nos EUA. Também na fase
1, essa iniciativa tem o objetivo de criar uma imunização à base do
vírus da zika inativado, eliminando o risco de efeitos colaterais. Essa
técnica é utilizada para as vacinas contra poliomielite e hepatite A,
por exemplo.
Alguns cientistas também buscam uma imunização eficaz contra
o chicungunha. São dois projetos em curso até o momento, ambos fora do
país. Ano passado, o número de casos dessa doença no Brasil superou o da
zika.
PARANÁ APLICA VACINA CONTRA DENGUE
Já
a dengue, velha conhecida dos brasileiros, encontrou uma adversária à
altura há pouco mais de um ano, quando a primeira vacina contra a doença
foi aprovada no país. Criada pela Sanofi, a imunização feita em três
doses começou a ser aplicada no Paraná, em agosto de 2016. Disponível na
rede pública do estado, a vacina tem eficácia de 74% já na primeira
dose. No entanto, a cobertura ainda está muito aquém do desejado. A meta
era vacinar 80% do público-alvo — pessoas entre 15 e 27 anos —, mas
apenas 40% compareceram aos postos. No restante do país, a vacina só
está disponível em clínicas privadas.
— Traçamos uma meta ousada. Mas acho que a cobertura foi
satisfatória, em especial por se tratar de uma vacina inédita e de o
início da campanha ter sido no inverno, quando há poucos casos — analisa
Júlia Cordellini, diretora do centro de epidemiologia da Secretaria de
Saúde do Paraná.
A segunda dose da vacina começará a ser dada em 3 de março, e o próximo reforço está programado para setembro.
O último grande surto de dengue no Brasil ocorreu em 2013,
quando mais de dois milhões de pessoas foram afetadas. E, mesmo sem
grande alarme, os números continuaram altos desde então. No ano passado,
o Ministério da Saúde recebeu quase 1,5 milhão de notificações.